17 mai 2016 / Media & Publicações

Coaching: A mesma língua em Portugal e no Brasil?

Sofia Calheiros: Trabalha desde há três décadas na área dos recursos humanos, focou-se no desenvolvimento do potencial das pessoas e das organizações e, mais recentemente, apresentou ao mercado a Sofia Calheiros & Associates. Eliana Dutra: Apresenta-se como “coach especialista em presidentes, C’s, country managers e herdeiros”. Foi pioneira no Brasil, onde tem a sua empresa, a PRO-FIT Coach e Treinamento, mas desde há algum tempo que faz várias pontes aéreas de ligação a Portugal. 

Hoje, e depois de se terem conhecido há uns anos, são parceiras em alguns programas. A Executive Digest juntou-as para falar de coaching e dos pontos que se afastam e aproximam entre os dois países.

 

O que difere entre o Portugal e o Brasil em termos de coaching? Apenas a maturidade do mercado e o tipo de solicitações, como seja o desenvolvimento de talentos ou a melhoria da inovação! Porque, no final, o que o coaching trabalha são as pessoas. E, pessoas são pessoas.

 

Qual a fase de maturidade do coaching no Brasil? Difere muito de Portugal?

Eliana Dutra – Costumo comparar o nível de maturidade com o do mercado de vinhos, há 20 anos. Na altura, as pessoas entravam num restaurante e escolhiam pelo preço porque não sabiam escolher pela qualidade. Ou seja, achavam que o que era mais caro seria o melhor. Só que essa não é uma boa forma e o mercado de coaching, hoje, está assim: não há informação para se saber escolher. Há empresas que são multinacionais, que contratam coachings bastante imaturos. E não pode ser assim. Para se ser bom profissional é preciso estudar, amadurecer, testar coisas…

 

A Eliana foi quase pioneira…

Eliana Dutra – Fui pioneira no Brasil e, na altura, foi mais fácil apresentar o meu trabalho. Hoje o mercado está muito competitivo, há muita gente a fazer bons trabalhos mas também há muita gente a trabalhar mal e destruir o próprio mercado.

 

Hoje, é apresentada como coach de presidentes e CEO’s. Focou-se no topo!

Eliana Dutra – Foquei-me no topo porque tenho uma equipa que trabalha os outros níveis da organização. E hoje tenho alguns projetos que me estão no coração, que demoraram anos, e em que se junta coaching com treino, ferramentas de recursos humanos e em que se consegue uma transformação da empresa no todo. Um trabalho pelo qual tenho muito carinho foi o que desenvolvemos, por exemplo, no Copacabana Palace. Era uma empresa familiar que foi adquirida por uma cadeia hoteleira e que teve que se adaptar a uma nova gestão.

 

Este trabalho, por exemplo, começou no topo mas alargou a diferentes níveis da organização. Porque será impossível fazer um trabalho com o CEO e depois não alargar às bases, não?

Depende. Por exemplo, temos um cliente que é um banco de investimentos e trabalhámos o dono e o gerente como um todo, ao mesmo tempo. Agora, se a empresa for muito grande é difícil trabalhar apenas a administração. Quando isso acontece, há mais hipóteses de o trabalho não resultar. Regra geral, os clientes contactam-nos com um pedido, como seja a ajuda para gerir uma sucessão. Quando chego, o que tenho que saber é qual é o desafio, como é que a empresa se está a organizar, e, a partir de um conjunto de perguntas, vou tentando descobrir quais são os gaps e qual o programa que mais se adequa a cada caso. Mas é muito importante perceber qual a cultura da organização. Não vale a pena, por exemplo, chegar a uma empresa de comunicação e tentar oferecer um formulário que se enquadra bem numa empresa com cultura financeira… É preciso saber adaptar.

 

Definiria o seu trabalho como avaliação de um diagnóstico e posterior oferta de um conjunto de ferramentas que ajuda gestores e empresas…

Eliana Dutra – … e que os ajuda a superar os desafios. Em média, são trabalhos que duram mais de um ano.

 

Até que ponto é que os dois mercados, o português e o brasileiro, diferem e se aproximam?

Sofia Calheiros – Há muitas diferenças, até porque são dois países com culturas muito diferentes. Só que, no final do dia, pessoas são sempre pessoas. E nós trabalhamos com pessoas. Quando se trabalha ao nível do coaching, há uma essência que é universal. E, aqui, não interessa a cultura ou o género. As diferenças têm muito que ver com circunstâncias situacionais.

Eliana Dutra – Há uma maior diferença quando se fala de gerações do que quando se fala de país. Sinto uma maior diferença quando estou a fazer um trabalho de coaching com um baby boomer ou alguém da geração Y, do que com portugueses. Aliás, trabalhámos, lá no Brasil, com quadros portgueses da Novabase e não senti qualquer diferença.

 

Os gestores já estão conscientes da importância da ferramenta?

Eliana Dutra – No Brasil, nem por isso.

Sofia Calheiros – Em Portugal, completamente, e não só do ponto de vista profissional. Aderem a contratar alguém que ajude ao seu desenvolvimento pessoal, como também o fazem a nível particular. No topo, CEO’s ou CFO’s todos os “C’s”, não conheço um que não tenha feito coaching.

 

E depois, no geral, trabalha junto dos diferentes quadros da empresa?

Sofia Calheiros – Tem de sersistémico. O desejável seria começar no topo e ir descendo em cascata. Mas, por vezes, tem acontecido de outras formas e com diferentes ângulos. Em Portugal, todos os “C’s” que conheço têm coaching e já estiveram em mais do que um processo com um coach diferente.

 

Quais são os principais motivos que levam um gestor a procurar um coach?

Sofia Calheiros – Os motivos têm muito que ver com os resultados da organização e a perceção de que, para os atingir, tem que ser através das pessoas. Normalmente, a área em que têm mais dificuldade é em gerir, motivar, mobilizar os colaboradores. Para o conseguirem, começam a trabalhar competências que, muitas vezes, são as que impedem de conseguir fazer as coisas bem feitas. Nos últimos anos tem havido a consciência de que é importante passar de um posicionamento só de gestão tradicional para uma gestão com pessoas. E, aqui, há uma forte perceção da existência de um gap e da necessidade de ajuda.

Eliana Dutra – Há uma questão que explica a diferença entre os dois mercados e tem que ver com o facto de Portugal estar a sair de uma crise e de o Brasil estar a entrar numa nova crise.

Houve um período em que era preciso muito coaching para desenvolver talentos. Hoje há talentos e começa a não haver oferta suficiente para esses mesmos talentos.

 

Sofia Calheiros – Mas nesta última crise que Portugal atravessou notou-se uma grande diferença nas empresas. Nos outros momentos, um dos primeiros cortes ia para áreas como marketing, publicidade ou formação de pessoas. Posso dizer que o meu negócio, agora, não teve crise. Ou seja, numa situação de crise, paradoxalmente não houve um corte mas, sim, um investimento nas pessoas.

Há uma forte perceção de que, se mexermos nos básicos, quando a crise passar vamos ter um grave problema porque não vamos lá ter as pessoas certas nos sítios certos.

Eliana Dutra – No Brasil, as empresas que estão a sair de uma época de prosperidade estão à procura de pessoas que lhes garantam resultados. Antes, precisavam de quem lhes garantisse inovação e alavancagem do potencial. Agora, estão outra vez preocupados com a produtividade. É a necessidade de manter o conhecimento, o saber do negócio. Antes, isso dependia dos mais velhos. Agora, há sistemas e formações que o garantem.